sexta-feira, 1 de junho de 2012

Notas (muito) breves de um dia na Palestina

Passagem por um checkpoint. Como é sexta-feira quase não há ninguém e talvez por isso mesmo se veja, no desgaste das estruturas e na paisagem do espaço público, o caráter de exceção à normalidade que assumem estas terras de ninguém - mas onde alguém controla alguém. 



      O espaço urbano de Ramallah chama logo a atenção pela mistura entre os efeitos de menos recursos, por um lado, e o crescimento rápido e a construção, como efeito da sua capitalidade na Autoridade Palestiniana. 

    Conduzido por um palestiniano, funcionário de uma representação diplomática. Homem inteligente, sensato e sensível. Como muitos palestinianos, viveu nos EUA e regressou na altura dos acordos de Oslo, com muitas esperanças, que o período da segunda intifada deitaram por terra. Da sua casa vê-se Tel-Aviv e o mar...


    De vez em quando - demasiadas vezes - na paisagem, surgem colonatos. É talvez a forma mais absurda que o conflito assume e o principal obstáculo à sua resolução. Os colonatos constituem formas de assentamento política e ideologicamente motivado, apropriando-se de terra e água, dividindo, com as estradas de acesso exclusivo, a terra dos locais, criando obstáculos. Junte-se-lhe o  muro de segurança e o seu percurso sinuoso, os checkpoints e a necessidade de os palestinianos solicitarem autorizações para entrarem em Israel, e temos a receita para o desastre.

    História moral contada: Neste caso os colonos (casas à direita) propuseram comprar a casa palestiniana à esquerda. Foi heroicamente recusada uma oferta milionária. Casos há, pelo contrário, de pessoas que venderam terras e emigraram, para fugirem à censura social...

      (A área do previsto futuro estado palestiniano está dividida em três tipos de zona. As zonas A, da Autoridade Palestiniana; as zonas B, com controlo civil desta e controlo militar de Israel; e as áreas C, de total controlo israelense. O resultado é um mapa retalhado, sinuoso, descontínuo, de sucessivos ilhamentos.)
      (Um campo de refugiados (Al Jalazoun) que, na realidade, já se transformou numa aldeia de apertadas estruturas de autoconstrução. Estabelecido sobre terras de uma aldeia local (Ein Synia), os anos e processos sociais e económicos vários, fizeram com que os seus habitantes acabassem por prosperar mais do que os aldeãos, para cujas terras se expandem. As coisas são, sempre, mais complexas do que parecem)

    Aldeia de Jiffna: curioso "pelourinho" - fontanário segurando poste elétrico. Loja aberta à sexta, vendendo também álcool: aldeia com população cristã, duas igrejas, uma católica, outra grega ortodoxa.



    A universidade de Bir Zeit.



    A povoação de Bir Zeit, com o centro Rozana cuidando da herança cultural local





    (Seguindo por uma estrada sinuosa, num vale. A estrada ligava dois colonatos e foi recentemente aberta a trânsito palestiniano. O ritmo de construção na Palestina é agora tal que os lixos da construção civil são lançados nas margens das estradas.)

    Taybeh, local da cerveja palestiniana. Única aldeia inteiramente cristã. Maria, esposa do dono e presidente da câmara local, é grega e oriunda dos EUA, onde o casal viveu (em Boston), tendo o casal regressado à Palestina com os acordos de Oslo.Passaram primeiro por Tunis para se aconselharem junto de Arafat sobre a oportunidade de lançar um negócio de álcool numa terra 98% muçulmana.

    O vídeo explicativo do processo de fabrico da cerveja. Ao lado, o proprietário e Srafat.



    A importância da diáspora e do apoio internacional também se faz sentir na Palestina
    Taybeh transformando-se, pela iniciativa de entusiastas, letrados e empresários locais, num local de possível futuro turismo.




    A incrível familiaridade e semelhança da paisagem...







    Arte palestiniana contemporânea em casa de uma pessoa hospitaleira


    (A sensação clara das continuidades, semelhanças e integração das pessoas e comunidades desta região - quer de Israel/Palestina, quer do levante em sentido mais lato; a sensação de "jusxtaposição" - da reivindicação da mesma terra por dois povos e entidades; e ainda a sensação da iniquidade do sistema de ocupação e suas manifestações quer mais rituais e performativas, quer mais reais nas suas consequ~encias nefastas na economia, na liberdade, na dignidade - colonatos, muro, checkpoints. E uma enorme familiaridade e "estar-bem" - para não confundir com bem-estar, claro - ali, como em Israel)

    (E a sensação de que não se percebe mesmo onde tudo isto vai dar...)

    Repito: notas muito, muito breves e sem a riqueza das muitas conversas, pormenores, informações, estados de espírito, insinuações, que por um lado não quero transmitir aqui, quebrando a privacidade dos mesmos ou o anonimato e resguardo de pessoas e, por outro, pela pura e simples falta de tempo nestes últimos dias da estadia, cheios de atividade. Mais em Lisboa, portanto...

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